‘‘Essa experiência humana é como uma casa de hóspedes. Toda manhã, uma nova chegada…’’

Angelus Novus - Paul Klee

Transformando o espaço psicoterapêutico

A ideia de iniciar o projeto Laboratório Narrativas surgiu nos estudos de casos de minha experiência como psicólogo e psicoterapeuta em três contextos distintos: na clínica, na educação e na psicologia social em comunidades. Ao longo desta trajetória na escuta psicológica do sofrimento humano, pude notar que um fenómeno se repetia com regular frequência: uma parcela considerável das queixas, nos mais distintos cenários, era caracterizada por uma inexorável incapacidade de elaboração e enunciação das próprias vivencias.

Na tentativa de ajudar meus pacientes, chegou-me às mãos os escritos de Walter Benjamin, especialmente os textos sobre o conceito de história e de narração. Primeiramente a sua interpretação da obra “Angelus Novus”, de Paul Klee: o espanto do anjo que olha para o passado e o vê como um bloco monolítico catastrófico, enquanto é projetado pelos ventos do progresso para um futuro que ele vira as costas. Trabalhei estas imagens em vários casos, de diversas formas, nos mais variados contextos e pude constatar o avanço dos pacientes com relação as condições de associação livre, maior ousadia com as palavras, no relato de suas próprias experiências... muitos pacientes foram capazes de arriscar mais com as palavras, com a literatura, com a poesia, narrar as próprias histórias extraindo delas experiências significativas. Daí fizemos outros experimentos, sempre buscando estabelecer um espaço psicoterapêutico seguro e propício à narração das próprias vivências, a este espaço eu chamo de laboratório narrativas.

Portanto, nesta proposta, a ideia de laboratório não designa um endereço, uma instituição ou espaço físico equipado com instrumentos para a realização de experimentos psicológicos, no sentido usual da expressão. É, antes de mais nada, um fenômeno que surge na relação transferencial entre o analisando e o analista e torna possível o labor oratório dos sujeitos que enunciam as próprias vivências, tornando-se capazes de ressiginificarem e narrarem suas próprias experiências.

‘‘É, antes de mais nada, um fenômeno que surge na relação transferencial entre o analisando e o analista e torna possível o labor oratório dos sujeitos.’’

É muito importante que os nossos clientes/pacientes entendam que o sucesso de um trabalho como este está vinculado a um comprometimento ético com o processo, por parte de todos os envolvidos. Pois, ao longo dessa trajetória o sujeito entra em contato com o que há de mais singular na experiência humana, descobre que há muito mais potência em si que as condições impostas por suas bases biológicas

“Nada do que é humano, me é estranho”.

2 regras fundamentais

Associação livre

Fale. Livremente. Fale o que lhe vier à cabeça, sem restringir nenhum pensamento. Por mais absurdo, torpe, infantil ou irrelevante que tal pensamento lhe pareça. Fale com liberdade.

Sem concessões ou pactos com o sofrimento.

Não é possível passar por uma experiência analítica e ao mesmo tempo permitir-se permanecer no lugar de objeto vitalício do desejo alheio. É preciso se implicar na tua história pessoal, tornar-se responsável por sua posição de sujeito e enfrentar com dignidade os desafios que surgem nos teus caminhos.

“Conta a tua história, fala dos teus amores e dos teus desenganos. Conta para mim seus desejos e o sonho escondido que não realizou”